Cimentos da Beira: Falência ou a história de um Golpe? (1)

Cimentos da Beira: Falência ou a história de um Golpe? (1)

  Por Luis Nhachote Desde Março de 2022 - cerca de três anos - que, na cidade portuária da Beira, está em curso um processo de apropriação

 

Por Luis Nhachote

Desde Março de 2022 – cerca de três anos – que, na cidade portuária da Beira, está em curso um processo de apropriação da Fábrica de Cimentos de Beira (FCB), por via de um processo de insolvência administrativa, com requintes criminais, cujas evidências nos sugerem estar-se diante de tentáculos de intricada teia infiltrada desde o sector da justiça ao comercial local.

A Procuradoria provincial de Sofala recebeu duas denúncias, sendo que a primeira em termos anónimos e, a segunda, associada a conhecidos rostos no tecido empresarial e social da cidade da Beira e com comando a partir de praça italiana.

Desde de Dezembro de 2024 que o Centro de Jornalismo Investigativo (CJI) segue este caso delicado e mergulhou na sua investigação cujos contornos partilha agora com o público para que este possa entender os contornos do caso que parece precisar da chamada “independência do judiciário” para salvar uma centena de trabalhadores, penalizar e processar actores internos e externos que parece terem uma agenda clara: apropriação de uma unidade fabril relativamente nova segundo a lógica maquiavélica, a dos fins que justificam os meios.

 

“O Ovo de Colombo”

O Ministério Público (MP), como se sabe, é o guardião da legalidade e dono da acção penal recebeu, na aurora de 2022, várias denúncias que reportavam uma suposta crise sem precedentes na cimenteira. Deste modo o MP diante dessas queixas, algumas supostamente vindas da massa laboral, decidiu pela intervenção e solicitou que tribunais competentes decretassem uma acção de insolvência. O que veio a acontecer ano passado, isto já depois de o denunciante original haver exibido o rosto.

Sucede, porém, que para se declarar insolvência era necessário que a empresa não conseguisse cumprir com as suas obrigações fiscais e salariais, o que claramente não era o caso da Cimentos da Beira que continuava a honrar os seus compromissos e até, já em sede do processo em curso, depositou uma caução no tribunal.

 

A acção especial de insolvência registada sob o número 25/TJPS/SC/2022, foi requerida pelo Ministério Público em seguimento de uma “denúncia anónima”, alegadamente apresentada por trabalhadores da FCB. Legenda para a caixa

Decreto-Lei+1+2013+de+04+de+Julho+-+Regime+Juridico+da+Insolvencia+e+de+Recuperacao+de+Empresas+comerciais

Os documentos da “denúncia anónima” obtidos pelo CJI os queixosos, que acabaram por se revelar como se verá adiante, disseram à PGR que a empresa FCB possuía um saldo negativo de 2.000.000.000,00 Mts (dois mil milhões de meticais) e que esta (fábrica) “é devedora de diversas instituições do Estado, e ainda, possui dívidas com os trabalhadores”.

Notificada pelo Tribunal, para exercer o seu direito ao contraditório, a empresa juntou documentação bastante e fez prova da sua situação financeira. O CJI teve acesso a uma cópia do dossier remetido ao tribunal e nada indica que a empresa estivesse numa situação de insolvência.

Mesmo assim, a Procuradoria provincial optou pelo caminho da promoção das pretensões da “denúncia anónima” e o Tribunal Judicial da Cidade da Beira decidiu dar provimento. Ambos não realizaram nenhuma perícia à entidade visada para confirmar ou não as denúncias.

O que causa estranheza é que a cimenteira é colocada numa situação de camisa-de-forças por conta de uma alegada dívida de 7.000.000.00 Mts (sete milhões de meticais), quando a mesma, tem contas mensais de consumo de energias superiores a esse valor. “Não faz sentido que uma empresa que paga contas de energia 10 milhões de meticais mensais ser submetida a processo de insolvência por conta de uma dívida de 7 milhões” disse-nos uma fonte na cidade da Beira, onde o CJI esteve nos meses de Dezembro e Janeiro a conduzir verificações.

A denúncia “anónima” indicava que a Cimentos da Beira apresentava um capital negativo de dois mil milhões de Meticais e que era devedora de várias instituições, incluindo o Estado moçambicano. Adiantava a mesma que a empresa acumulava dívidas com os trabalhadores, sugerindo que a empresa estava à beira da falência.

 

Acto Um: Absolvição da empresa

Por falta de fundamento, as autoridades judiciais absolveram a empresa, segundo uma sentença lavrada por Antonio Charles, então juiz do caso e atualmente juiz presidente do TJPS. Temos, em nossa posse, uma cópia do referido despacho, que em resumo, explica, o que nele se verteu.

No dia 11 de Agosto de 2022, isto e, cinco meses depois da “denúncia anónima” ter sido acolhida pelo MP – que por lei está isenta de pagamento de custas – António Mario Romão Charles, juiz de Direito “A” exarou um despacho, onde, entre outros, oferecia a CDB, para num prazo de dez dias juntar os seguintes documentos: demonstrações contabilísticas, balanços, demonstrações de resultados acumulados, relatórios de fluxos de Caixa, relação nominal dos credores, relação de bens até a relação dos administradores. A CDB respondeu ao despacho em tempo útil.

 

 

Da Decisão

No dia 24 de Novembro de 2022, o mesmo juiz – que posteriormente seria promovido às funções de juiz presidente do TJPS – exarou um despacho onde ressalta a não necessidade de decretação da insolvência pedida pelo MP.

“No nosso entendimento, salvo posição contrária, o MP, representando o Estado-Administração, titular do controle de receitas da Fazenda Nacional, tem a luz da Alínea d) do artigo…..legitimidade para requerer a insolvência, pelo que a excepção de ilegitimidade activa não pode proceder, termos em que vai julgada improcedente….”

Em relação aos argumentos da cimenteira após exercer o contraditório e apresentar a documentação exigida, o juiz escreveu que “sucede que na oposição e actos subsequentes a requerida juntou comprovativos, de que não deve à Fazenda Nacional, nem tem dívidas vencidas, cuja validade vigora até 05 de outubro de 2022, vide documentos de fls 214 dos autos”

Foi com base nos argumentos e documentos vertidos em sede de processo que o juiz tomou a decisão de: a) dar provimento à excepção dilatória de inépcia por falta de causa a pedir, b) não decretar a insolvência requerida e por conseguinte: c) absolver a requerida Cimentos da Beira, lda da presente instância. (o sublinhado é da responsabilidade do CJI).

Pouco tempo depois, uma nova acção de pedido de insolvência volta à carga e desta vez com nomes e rostos, como iremos expor no artigo que se segue. (CJIM)

 

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